segunda-feira, 7 de outubro de 2013

Coordenador

Diagnósticos duvidosos de TDAH

Antes de atribuir o fracasso do aluno ao Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH), é preciso uma investigação cuidadosa

Na última década, o diagnóstico de Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade (TDAH) tomou conta das escolas brasileiras. O aluno com baixo rendimento - que demonstra dificuldades em se concentrar e seguir instruções, necessita de um tempo maior para finalizar as tarefas e apresenta inadequação comportamental e impulsividade - é encaminhado para um psiquiatra ou um neurologista. Após a realização de testes que confirmam o TDAH, o médico receita estimulantes à base de metilfenidato - conhecidos comercialmente como Ritalina ou Concerta -, capazes de melhorar a concentração. Às vezes, um acompanhamento psicoterápico complementar também é indicado. 

Entretanto, antes de aceitar o discurso médico na escola, precisamos encará-lo com um olhar crítico. No meio científico, há controvérsias sobre o TDAH. Não se sabe ao certo se as causas do transtorno são orgânicas ou sofrem influência do meio. Além disso, alguns especialistas colocam em xeque a precisão do diagnóstico argumentando não ser possível estabelecer limites objetivos entre o TDAH, outras desordens de comportamento e o comportamento normal. 

Uma coisa, porém, é consenso: existe um excesso de diagnósticos médicos e de prescrição de estimulantes. Uma pesquisa feita em escolas públicas de Campinas, a 93 quilômetros de São Paulo, revelou que muitas crianças diagnosticadas com TDAH tinham, na realidade, problemas de visão. Ao começar a usar óculos, 57% delas melhoraram a concentração e 51,1% passaram a concluir tarefas que antes não conseguiam terminar. Outro estudo, conduzido pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj), analisou 31 produções científicas sobre o metilfenidato. Todas davam parecer favorável à droga. Contudo, 87% das publicações apresentaram conflito de interesse, pois haviam sido realizadas em coautoria com laboratórios de medicamentos ou financiadas pela indústria farmacêutica. 

O filósofo e professor francês Michel Foucault (1926-1984) alertou sobre o processo de medicalização da sociedade. Para ele, o diagnóstico deve ser questionado quando a natureza social dos fenômenos é omitida. Observemos, por exemplo, a rotina da infância hoje. Há crianças que passam mais de oito horas por dia no computador e se entediam rapidamente diante de brinquedos que em outros tempos as convidavam a pensar, interagir, fantasiar e criar. Será que o excesso de estímulos eletrônicos não contribui para a falta de concentração? 

Não é possível compreender o comportamento humano sem levar em conta a cultura. Antes de atribuir o baixo rendimento escolar a um problema clínico e transferir aos médicos a responsabilidade pela aprendizagem, deve-se fazer uma cuidadosa investigação pedagógica: observar as situações em que o aluno se comporta de modo inadequado e aquelas em que ele responde positivamente, identificar as variáveis que influenciam no desempenho - como a adequação dos materiais didáticos, a estrutura do espaço físico, o nível de ruído, a motivação da equipe e a gestão da aula - e refletir sobre como mudar esse cenário. Não somos onipotentes, mas precisamos reconhecer que a ação do professor é determinante no processo de aprendizagem.

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