quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Regras morais e convencionais: qual a diferença?

Post do blog de orientação educacional sobre a explicação das regras para os alunos. Ilustração: André Menezes/Editoria de Arte
Um bom exercício para fazermos durante nossa vida de educadores é refletir sobre nossas reações diante de diferentes “problemas” que enfrentamos com nossos alunos. Você já parou para pensar como reage quando um aluno deixa de fazer a tarefa de casa? E quando usa fones de ouvido na sala de aula? E quando coloca apelidos em algum colega?
Refletindo hoje sobre minha prática como professora, me dou conta de que muitas vezes acabei me incomodando e me mobilizando mais com transgressões aos combinados convencionais (aquelas que negociamos com os alunos) do que com o desrespeito a regras morais, que não devem ser negociadas. Acredito que isso seja comum também a outros educadores que, como eu fazia, deixam de refletir com a turma sobre a importância dessas normas estabelecidas pela moralidade.
Com o auxílio da literatura, começamos por defini-las. Segundo Silvia Parrat-Dayan, pesquisadora da Universidade de Genebra: “as regras morais estão associadas à justiça, à integridade dos outros e ao respeito aos seus direitos”. Elas tratam, portanto, de valores que se aplicam a todo ser humano independente da cultura, raça ou religião e não são passíveis de negociação.
Não se negocia atitudes de violência física, psicológica ou moral. Não se negocia o respeito ao ser humano, à propriedade ou à boa convivência. E por isso, as regras morais, possuem um valor maior para o trabalho com o desenvolvimento da autonomia de nossos alunos do que as convencionais. Isso não significa que estas últimas não sejam também importantes para a organização da vida social. Mas é sempre bom alertar: o que é convenção não pode e não deve se sobrepor ao que é moral, caso contrário, estaremos diante de uma inversão de valores.
Pensemos juntos! Toda regra, seja convencional ou moral, deve nos dizer como agir, o quedeve ou não ser feito, certo? As regras regulam a convivência, e por isso, são tão necessárias, mas é também necessário refletir sobre sua aplicação É indispensável nos perguntarmos: em nome de que se deve agir. Afinal, no que se baseia tal regra? O que a sustenta? Enfim: Qual é o princípio que orienta o caminho a ser seguido?
E aqui vamos entender algo fundamental: todas as regras são baseadas em princípios – morais ou não morais. Resta-nos, portanto, uma boa reflexão sobre quais princípios têm se evidenciado mais em nossas relações (com alunos e colegas): será o da organização, o do controle, o da obediência; ou, o do respeito, o da justiça, o da generosidade?
A resposta parece ser óbvia e simples. Nem tanto. Imaginemos algo totalmente “improvável” na escola: um aluno chega atrasado para a aula, em que há a regra de “Estar dentro da sala antes da entrada do professor”. Explica que estava acompanhando um colega de outra sala que passara mal no banheiro. Antes mesmo de ouvir a justificativa do aluno o professor faz um belo discurso, trazendo inclusive, à tona (lá do “fundo do baú”), outras situações em que o mesmo aluno supostamente tenha “atrapalhado” ou “interrompido” a aula, não permitindo sua entrada na sala.
Analisemos detalhadamente a situação: em nome do controle e da organização, houve o menosprezo a uma atitude moral, de generosidade. E mais, a exposição e humilhação do aluno como personagem central do sermão, ferem o princípio moral do respeito à dignidade.
E aí vocês podem indagar: “Mas e se for mentira do aluno?” Minha resposta é: a verdade é outro princípio moral a ser trabalhado nas relações em que a confiança está presente. Portanto, naquele momento, o foco não deve ser a mentira (ou não) do aluno.
Uma atitude construtiva, em que prevalecesse um princípio moral por parte do educador, deveria permitir a entrada do aluno, alertando-o sobre o que já tivesse sido feito em sala de aula a fim de integrá-lo ao grupo. Esse ato mostra confiança na palavra do aluno e valida solidariedade como um valor importante. Caso ele esteja mentindo, sua atitude poderá provocar no aluno o sentimento de vergonha e culpa por não estar agindo de acordo com a confiança depositada pelo professor.
O exemplo de atraso dos alunos é somente uma das muitas situações que enfrentamos em nosso dia a dia, na escola. Cabe-nos, porém, pensar o que queremos para nossas crianças e jovens: uma educação que reproduza o conformismo e a obediência cega às regras, ou uma que se fundamente no respeito ao ser humano?
Fica aqui uma sugestão: Ao invés de repetirmos a ideia de que a escola é o reflexo da crise moral da sociedade, façamos nosso papel também de agentes morais, conscientes de que um trabalho compromissado com a formação do ser humano pode refletir e inspirar uma sociedade mais justa.

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